Zâmbia Fase IV – 3º Dia (Rufunsa – Kacholola)

 

Acordei às 7h00 de um sono pesado que me fez esquecer o tamanho da cama onde havia adormecido. A luz do dia já trespassava a fina cortina da janela do quarto.

A custo, levantei-me e iniciei o processo de preparação do meu pequeno-almoço. Iria necessitar do meu fogão a diesel e do pacote de esparguete instantâneo.

Não tinha nada que saber. Era apenas uma questão de ferver a água e espetar o conteúdo do pacote dentro da panela.

Era minha intenção iniciar a etapa até Kacholola o mais depressa possível. O Sol e a temperatura “menos fria”, já se faziam notar. Por seu lado o vento ainda não tinha dado sinal da sua graça.

Quando me preparava para acender o fogão no pátio em frente ao meu quarto, apareceu o Johnson.

DSCF4884 O Johnson era o responsável pela cantina do hospital e vinha me perguntar o que eu queria comer para pequeno-almoço. Eu não estava à espera de tal oferta, pois na noite anterior haviam-me informado que o pequeno-almoço não estava incluído no quarto e que a cantina do hospital não estava em funcionamento.

Fosse como fosse, diante mim estava o Johnson com um ar simpático. Aguardava pelo meu aval para a preparação do pequeno-almoço. Pedi-lhe para preparar um pequeno-almoço energético e solicitei também que cozinhasse o meu pacote de esparguete instantâneo (com sabor a bife de vaca). Sempre seria mais um aconchego para o estômago e uma fonte de hidratos de carbono para o organismo.

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Deixei a St Luke’s Mission Hospital às 8h40 e percorri os 6Kms até ao cruzamento com a estrada principal.

 

O vento arrebitara, apesar de ainda não estar muito forte.

Contudo o que mais me incomodava no vento, não era o facto de este estar de feição (já estava mentalizado para isso) mas sim o facto de o vento ser frio.

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Já passava das 9h30 e não havia maneira do dia aquecer. O Sol saltava de nuvem em nuvem para que eu permanecesse constantemente debaixo de uma sombra, mesmo que em meu redor estivesse céu limpo.

DSCF4892 O vento fazia a temperatura baixar bastante.

Os joelhos e as clavículas acusavam essa descida de temperatura através de picadas geladas nas articulações.

Os braços e as pernas estavam cobertos de “pele de galinha” devido aos constantes arrepios de frio.

Valeu-me uma longa subida de 3Kms de cumprimento que me levou dos 804m até aos 972m de altitude de modo que o meu metabolismo aqueceu ligeiramente. Continuei a subir por mais 5Kms até aos 1097m fazendo com que se iniciasse o processo de libertação de gotículas de suor através dos poros da minha pele.

DSCF4895No entanto, esta confortável sensação de calor duraria pouco tempo. O vento, a Estação de Ano e o facto de eu estar acima dos 1000m de altitude, contribuíam para esta bruta descida de temperatura.

Uma vez mais, tentava manter a cabeça ocupada com todo o tipo de pensamentos a fim de evitar passar o resto do percurso a insultar o vento gélido que me queimava a pele das pernas.

Recordava que no meu plano inicial, a viagem não era de Luanda para Maputo, mas sim em sentido contrário, de Maputo para Luanda.

Algumas dúvidas sobre a obtenção de visto nas fronteiras Angolanas fizeram-me inverter o trajecto da viagem. Assim optava por entrar em Angola pelo aeroporto de Luanda com um visto de turista evitando qualquer tipo de surpresas desagradáveis.

Nos preparativos da viagem lembrava-me de DSCF4898me preocupar com a preparação física, mas presentemente verificava que a preparação psicológica não era menos importante. Principalmente no combate à “mesmice” e à solidão da viagem.

 

Valia-me a estrada de montanha que ia mantendo-me entretido. Uma estrada com longas subidas e acentuadas descidas fazendo a bicicleta atingir altas velocidades e consequentemente gelando o meu tronco e joelhos.

Perto do meio-dia o vento acalmou e a temperatura subiu ligeiramente. Automaticamente a minha moral alterou-se para melhor. Deixava de ser obrigado a contrair os ombros numa tentativa de “expelir” o frio do meu corpo.

Pouco depois cheguei ao cruzamento com a estrada que seguia para Luangwa. Este era o local por mim escolhido para o almoço, pois assinalava metade do caminho até Kacholola.

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Era igualmente o local de paragem para muitos motoristas não só para se alimentaram como também para se abastecerem com produtos do comércio local.

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Comprei um cacho com 13 bananas para servir de almoço e de reforço alimentar para o resto da etapa.

 

 

Às 5 bananas que fizeram de almoço, juntei 2 Coca-Colas para que fossem melhor digeridas.

DSCF4917 Após alguns minutos de descanso a passear pelos estabelecimentos comerciais, fiz-me à estrada para enfrentar a segunda metade do percurso.

 

Metade essa que seria a mais difícil, pois teria que subir todo o vale do rio Luangwa.

 

Passei a ponte sobre o rio Luangwa, 5 minutos depois das 13h00 para de seguida iniciar a longa subida do vale até chegar a Kacholola.

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O relevo da região dificultava a minha progressão, baixando a velocidade média. Tal ainda não era motivo para preocupação. Com o estômago forrado a banana e o acréscimo de força anímica proveniente da subida de temperatura, encarava cada subida com um desafiante sorriso. Dava-me prazer olhar para uma longa subida, da qual não se via o fim, e saber que iria chegar ao topo sem parar para descansar.

De facto considerava que a minha forma física havia melhorado desde a minha saída de Luanda. Conseguia pedalar por mais tempo sem ter que parar para esticar os músculos ou descansar as pernas. As nádegas há muito que estavam em paz com o selim e os punhos já aguentavam bem o peso do tronco.

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Por pedalar num vale, o vento não era uma constante nesta parte da etapa.

Todavia sempre que atingia o topo de uma montanha, levava com uma forte rajada de frente recordando-me da sua existência.

Aos poucos as pernas foram dando sinal de cansaço.

 

Principalmente nos músculos junto aos joelhos que pareciam ter agulhas de crochet neles espetadas, fazendo-me duvidar se não teria feito alguma micro-ruptura.

DSCF4955Os últimos 20Kms foram uma penitência física e psicológica. Não só porque as pernas resolveram descansar antes da hora como também porque a temperatura ambiente baixara bastante.

Era obrigado a parar para esticar e relaxar os músculos ao mesmo tempo que ingeria umas bolachitas.

 

 

DSCF4950Começava a ser difícil tirar um auto-retrato estando a sorrir. Tinha que tirar várias fotografias contraindo os músculos faciais. Pelo menos numa delas iria parecer que eu estava a sorrir.

 

Às 17h10 cheguei a Kacholola. Passaram 8h33m desde que saíra da Missão em Rufunsa. Percorrera 125Kms na etapa do dia e tinha de ascensão acumulada 1633 metros.

Kacholola, tal como a maior parte das cidades por onde passara, era apenas um punhado de casas ao longo da estrada principal.

Alojei-me no Kacholola Motel. Um edifício de 1951, construído numa pequena colina e com uma vista magnífica para o vale existente do outro lado da estrada.

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Infelizmente o complexo encontrava-se bastante deteriorado estando muito longe das condições de outros tempos. Segundo a sócio-gerente do motel a falta de manutenção resultava da carência de investimento por parte dos sócios.

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Fiquei no único quarto que estava preparado para receber hóspedes, mesmo assim faltavam vidros nas janelas.

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Não existia rede eléctrica nem água canalizada em Kacholola. Como tal, o meu banho teria que ser a balde e iluminado pela luz de uma vela.

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O mesmo aconteceu com o meu jantar (esparguete com almôndegas), que foi saboreado no restaurante do Motel, também à luz da vela e à luz da minha lanterna.

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Continuava com o meu apetite titânico. Em 9 minutos devorei meio pacote de esparguete e uma lata inteira de almôndegas. Dava graças por ser o único cliente do motel e por a sala estar escura. Assim não houve a oportunidade de alguém presenciar o espectáculo.

Tinha de começar a controlar o meu apetite voraz, pois mais cedo ou mais tarde voltaria a almoçar/jantar com outras pessoas à mesa.

Já no quarto e enquanto fazia contas ao meu percurso, apercebi-me o quão diferente era esta região da Zâmbia quando comparada com a região Sul.

Não me referia a diferenças geográficas ou climatéricas, mas sim a diferenças de desenvolvimento económico.

As cidades e vilas do Sul da Zâmbia estavam relativamente bem equipadas no que respeita a infra-estruturas. A maior parte tinha água canalizada, electricidade, bancos, postos de combustível etc.

Na região Este da Zâmbia e pelo menos até Kacholola este tipo de condições eram totalmente inexistentes. Parecia que estava num outro país.

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A etapa seguinte seria até Petauke, uma localidade a 115Kms de Kacholola.

2 comentários:

  1. O teu psicológico não está tão "em cima" como deveria porque aqui nós, os que estamos sentados ao computador, nos temos esquecido de te dizer... FORÇA NAS CANETAS!!! Estamos todos a torcer por ti e vamos ficar cheios de pena (inveja!) quando a tua viagem acabar e nós deixarmos de ter o "tique" de ir consultar o teu blog para ver se há mais novidades! E apesar de tudo, Maputo "é já ali"! ;)
    Beijos e continuação de boa viagem!

    Cris

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  2. É isso: FORÇA NAS CANETAS!!!!! :) Sónia & Nuno

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