Moçambique Fase III (Mapinhane – Massinga)

 

Neste dia faziam exactamente 5 meses que havia partido montado na minha bicicleta de Luanda em direcção a Maputo.

Tal como era habitual, acordei cedo. Ainda o Sol não se tinha exposto por completo e eu já tinha os olhos abertos.

Contudo, um ataque de “preguicite” impediu-me de sair da cama à hora que despertara.

Depois de um ligeiro pequeno-almoço com aquilo com havia disponível aquela hora, iniciei a etapa do dia. Tinha como objectivo percorrer os 95Kms que me separavam do próximo destino em pouco mais de 5 horas.

A manhã estava fresca com alguma neblina matinal e o vento ainda estava fraco, o que fazia antever alguns facilitismos… pelo menos para as primeiras horas do dia.

DSCF8301Faltavam 10 minutos para as 8h00 quando dei a primeira pedalada em cima da bicicleta.

 

 

 

Logo à saída de Mapinhane, o famoso sinal verde recordava-me em forma de tortura, a distância restante das próximas etapas. Pelo menos este não fazia referência à curta distância remanescente até Maputo.

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Pouco depois encontrava-me completamente sozinho nas imensas e intermináveis rectas que apareciam em toda a parte, e que tornavam a viagem enfadonha.

DSCF8309 A monotonia criava tempo suficiente para a minha mente desviar-se da realidade e entrar em constantes introspectivas sobre a razão e sobre o balanço da minha viagem.

Com o final à vista, magicava roteiros alternativos para sair da EN1 e poder explorar mais de Moçambique. Mas a condicionante sobre o estado da minha bicicleta, não me permitia grandes aventuras senão a de me manter em piso asfaltado e sem grandes desníveis.

Apesar de contar com 5 meses de estrada, não me sentia minimamente cansado do estilo optado para viajar. Automaticamente vinha o desejo de chegar a Maputo, reparar a bicicleta e voltar para trás a pedalar até Luanda… ou até mesmo Portugal…

Mas nas poucas décimas de segundos de lucidez, tentava mentalizar-me que a aventura estava na sua recta final e que eu teria que aceitar que esta teria que chegar a um fim, mais cedo ou mais tarde.

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A cada pedalada, vinham as recordações dos dias passados desde o início da viagem. Cada vez com mais vivência e a cada dia, com mais frequência. Os lugares, os medos, os cheiros, as pessoas, as conversas, as dificuldades, as alegrias etc, eram tantas e fortes as recordações que invadiam a minha mente, que pareciam que todas elas haviam-se passado no dia anterior.

DSCF8311 Era necessário um forte abanão de cabeça (que quase fazia saltar fora o meu capacete) para afastar as nostalgias e as choradeiras do meu cérebro, de modo a conseguir concentrar-me e aproveitar ao máximo o que ainda havia para gozar.

Pela frente… apenas um grande ponto de interrogação…

 

Haviam se passado 2h30 de meditações indesejáveis quando chego a uma pequena povoação. O meu estômago acordou da sua sonolência e acusou a falta de comida.

Parei junto a uma loja onde se vendia de tudo, mas de comestível só havia um punhado de bananas. Avancei para a única alternativa e reguei-a com uma Coca-Cola.

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Ainda tentei fazer um pouco de conversa com a dona do estabelecimento, com o intuito de manter a minha cabeça ocupada e distrair-me dos assuntos que me massacravam a consciência. Todavia, esta não me parecia muito interessada em soltar mais do que alguns monossílabos, levando-me sair do estabelecimento e tentar decifrar o cartaz que estava na entrada, ao mesmo tempo que eu degustava a minha refeição.

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Pouco depois voltava sentar-me na bicicleta e retomava a pedalada.

Minutos mais tarde, apercebia-me que as minhas pernas já não estavam no seu melhor e que as bananas não tinham feito o desejo desejado. Dizia mal da minha recente malária e dos dias a mais de “descanso” forçado em Inhassoro, que haviam desabituado o meu corpo das exigências físicas das etapas.

66Kms depois de ter deixado Mapinhane, a estrada de alcatrão sumia-se debaixo da minha roda. A mesma estava em reabilitação e eu era obrigado a pedalar no desvio de terra batida, criado para a passagem do trânsito normal.

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Para mim era um esforço extra para evitar que as rodas se enterrassem na terra solta. Além que cada vez que passava um veículo por mim, eu desaparecia na nuvem de pó que este originava.

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No entanto os índices de motivação aumentaram, talvez por estar de volta a um percurso menos monótono ou simplesmente por estar perto do final da etapa.

Iria pernoitar no Estaleiro da Mota-Engil, perto de Massinga onde me esperava o Filipe e o Pedro, com quem tinha estado dias antes em Inhassoro.

Todavia, a proximidade ao final da etapa não era impedimento para a minha bicicleta me brindar com mais um raio partido. Algo que não me obrigava a parar, pois contava reparar este e outros problemas nas oficinas do Estaleiro.

Às 13h22m dava entrada no Estaleiro de Mota-Engil em Massinga.

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Depois de uma sessão de apresentações, fui encaminhado para os meus aposentos e para a cantina, lugar onde poderia restabelecer as minhas energias.

Já com o estômago confortado, estava na hora de deslocar-me às oficinas para a dita reparação da bicicleta.

A substituição do raio era uma coisa banal. Algo que eu já podia realizar mesmo de olhos fechados, tal era a frequência com que este problema surgia na minha viagem.

Contudo a solução para “renovar” a vida das minhas cremalheiras, já necessitava das mãos de um mestre.

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Com a ajuda de limas e serrotes, o Artur ia fazendo novos dentes nas cremalheiras da bicicleta para que estas aguentassem mais uns quilómetros até Maputo.

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Uma solução “engenheirísticamente” incorrecta, mas do meu ponto de vista 200% ideal e funcional. Só assim poderia garantir que a corrente passasse mais tempo engrenada com as rodas dentadas, em vez de andar a saltar de um lado para o outro dos carretos.

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Enquanto o Artur dedicava a sua arte à reparação de roda dentada, eu fazia uma vistoria ao aro da bicicleta… Conclusão: … sem comentários… o aro podia rebentar a qualquer altura, no entanto eu mantinha a minha persistência e esperança que este aguentasse até Maputo.

No final do dia, percorrera 97Kms em 5h37m, dos quais 29 minutos foram em repouso.

Para a etapa seguinte estava previsto chegar cedo a Maxixe pois eram apenas 68Kms. Se Estivesse em boas condições físicas, daria a volta à baia e seguiria para Inhambane (64Kms).

Se tal não fosse possível, iria optar por apanhar o ferry que ligava as duas cidades de modo a ir pernoitar em Inhambane.

Uma vez em Inhambane, iria programar uns dias para conhecer a orla costeira, onde estava incluída a famosa Praia do Tofo.

Moçambique Fase III (Inhassoro – Mapinhane)

 

Acordei cedo para preparar as minhas malas. Perto das 8h00, tomei o meu último pequeno-almoço na Casa Luna, na companhia do Carlos e da Aziza.

De estômago já conformado, estava preparado para agarrar a bicicleta e voltar a pedalar.

Após perto de 1 semana sem me sentar na minha bicicleta, eis que iria dar início a mais uma etapa. Seriam apenas 95Kms até Mapinhane, mas à parte do estado da bicicleta, os meus principais receios vinham da reacção do meu corpo ao esforço físico e ao Sol, após os dias de baixa com malária.

Eu sentia-me totalmente recuperado, mas isso era em condições normais e não debaixo de um esforço físico constante e com o Sol a bater na mona.

Eram as 9h25 quando iniciámos o processo de despedidas e tirámos as fotografias de família.

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Agradecimentos consumados (se é que alguma vez ficariam pagos) e chegava a hora de partir…

Deixei Inhassoro cheio de vitalidade nas pernas para chegar ao destino do dia.

Por um lado, custava deixar o conformo de “um lar”, para começar a pedalar novamente. Por outro lado, o meu corpo já pedia pelos pedais há muito tempo e já não se conciliava com a boa vida.

Voltei à estrada estreita por onde havia pedalado aquando da minha chegada a Inhassoro, mas desta vez em sentido contrário. Seguia ao encontro da EN1 com Inhassoro e o Oceano, nas minhas costas.

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Poucos quilómetros depois de ter iniciado a etapa, acabaria por ficar danado da vida. Acabara de observar que o vento estava de Sul e já com alguma intensidade. Tal façanha meteorológica só teria um significado:

- Assim que eu chegasse à estrada Nacional Nº1, e rumasse em direcção a Sul… seria obrigado a enfrentar o”amigo” vento…

14 Quilómetros depois, cheguei ao cruzamento com a EN1, rumei para Sul, levei com as primeiras golfadas de vento bem de frente e prossegui viagem.

A cabeça e o corpo ainda não acusavam as sequelas da malária, o que eram boas noticias.

Estava a avançar dentro dos parâmetros que eu havia delineado para a primeira etapa pós-malária, o único “senão” continuava a ser o vento frontal.

O cenário que me rodeava era exactamente o mesmo das últimas centenas de quilómetros. Uma estrada de alcatrão estreita e em péssimo estado. Muito trânsito pesado. Nos lados era mato de meia altura, a maior parte dele queimado, resultado das inúmeras queimadas provocadas pelos habitantes locais. De resto era sempre a mesma coisa.

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A etapa do dia estava a ser altamente monótona, ainda com a agravante do vento contra. Limitava a concentrar-me nas minhas matemáticas de previsões de chegada, distância percorrida etc com breves inspecções ao trabalho efectuado pelas duas pernas, para me certificar que estas perfaziam os ciclos de 360o a que estavam destinadas.

2h30m depois de ter iniciado a viagem até Mapinhane, eis que chego a “meia-distância” do final da etapa.

Decidi parar para esticar as pernas, relaxar um bocado, verificar se estava tudo bem com o meu metabolismo, comer um chocolate e verificar o comportamento da roda traseira da bicicleta.

Resultado, já tinha um raio partido. Como o dito raio era do lado dos carretos traseiros, para o substituir eu seria obrigado a desmontar a roda por completo. Decidi saltar este passo e seguir viagem com o raio partido. Já estava por tudo com tantos raios partidos…

Pouco depois cheguei ao cruzamento para Vilanculos.

Logo no início, o maldito placard verde que insistia em recordar-me a “meia-dúzia” de quilómetros que restavam até Maputo. Poucos metros depois, a indicação de estrada N240 para Vilanculos.

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Inicialmente Vilanculos fazia parte do meu plano de viagem, pois era uma povoação que me despertava interesse em visitar. Mais por ouvir falar do que por outra coisa qualquer.

No entanto eu havia desistido da ideia, devido aos dias a mais que ficara “internado” em Inhassoro.

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Se eu mantivesse a minha intenção inicial, estaria nesse momento a virar para a esquerda em direcção às praias. Mas a única mudança de direcção que fiz, foi também para a esquerda, mas em direcção à barraca que vendia Coca-Cola.

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Faltavam cerca de 30Kms até Mapinhane e eram apenas as 13h05. Iria chegar cedo ao meu destino.

Mantinha o meu organismo debaixo de uma monitorização constante para identificar algum sinal de uma malária mal curada. Mas os diagnósticos efectuados indicavam que tudo estava em bom funcionamento, apenas um certo cansaço ao nível das pernas, que eu encarava como normal, tendo em conta o vento que vagueava nas redondezas e tendo em conta o factor de recuperação da enfermidade.

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Os últimos longos 15 quilómetros, foram percorridos a uma velocidade bastante inferior à velocidade média até então.

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As pernas acusaram o cansaço (algo que eu não censurava) e o organismo não estava a responder da melhor maneira.

Optei por não esforçar e deixar-me seguir devagar até à povoação de Mapinhane.

 

Cheguei a Mapinhane às 14h55. Um símbolo conhecido, chamou a minha atenção e consequentemente captou o meu interesse como possível estabelecimento para almoçar e talvez pernoitar.

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Dirigi-me ao balcão do estabelecimento, verifiquei a existência de quartos e sentei-me para almoçar um guisado de cabrito. Enquanto esperava pelo almoço, decidi vistoriar os quartos disponíveis para escolher o melhorzinho.

À primeira vista, nenhum dos quartos satisfazia a minha pretensão. À segunda vista, também não…

Teria em primeiro lugar, de eliminar os níveis de acomodação da Casa Luna da minha cabeça. Só depois é que conseguiria entrar na realidade e voltar a apreciar a modesta acomodação que me era oferecida pela recepcionista.

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Voltei para a esplanada para almoçar o prato do dia.

Enquanto devorava a comida, verificava de longe o estado da bicicleta, para rapidamente descobrir que tinha 2 raios partidos. Parecia que estava sentenciado a substituir raios até ao fim da viagem.

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Efectuei também uma breve inspecção às rodas dentadas da bicicleta, para concluir que estas encontravam-se em bastante mau estado, deixando-me algumas dúvidas se iriam aguentar até Maputo.

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O resto do dia fora passado a reparar a bicicleta e a dar ao meu corpo o repouso devido.

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De Inhassoro a Mapinhane, percorrera 96Kms em 5h21m, com direito a 19 minutos de paragens… nada mau para quem tinha vindo de uma malária.

Moçambique Fase III (Estadia em Inhassoro)

 

Na minha primeira madrugada em Inhassoro, levantei-me por hábito do meu metabolismo. Queria ficar mais tempo na cama, mas contrariamente ao que eu pretendia, o meu corpo estranhava o conforto do leito.

Contemplei o nascer do Sol e já de barriga cheia, aventurei-me numa passeata pela praia com direito a molhar os pés no Índico.

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Assim que o Astro-Rei passou a fasquia do 45º com a superfície do mar, os calores apoderaram-me do meu corpo e uma forte dor de cabeça instalou-se em mim.

Receoso do pior, decidi recolher à minha tenda para o devido repouso, no entanto mais de 2 horas estendido na horizontal, não seriam remédio para o meu mal.

Pedi para levarem-me ao hospital da Vila para realizar o teste da malária, pois as minhas suspeitas indicavam nesse sentido.

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Após uns longos minutos de espera e a andar de corredor em corredor, eis que sou encaminhado para o banco de recolha de sangue.

30 Minutos mais tarde chegava o resultado… Estavam certas as minhas suspeitas, aquando da minha chegava a Save…

…Malária!

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Saí do hospital carregado de medicamentos comprados avulso, entrei no carro do Carlos (que tinha vindo buscar-me) e dirigi-me para a minha tenda para o devido repouso.

Desde a minha saída de Luanda que estava mentalizado para este tipo de inconveniente. No entanto após 5 meses de estrada sem apanhar nenhuma virose, não esperada vir a apanha-la a meia-dúzia de quilómetros do final da minha viagem até Maputo.

Ainda com capacidades racionais, calculei que os dias de tratamento adicionados aos dias de recuperação, iriam obrigar-me a nova programação dos trajectos futuros… mesmo que essa programação não existisse.

Almocei e iniciei o tratamento da malária com um saco de plástico cheio de comprimidos soltos.

Algumas horas depois, tinha a minha cabeça do tamanho de uma melancia, com uma densidade 100 vezes maior que o normal.

Podia esquecer os próximos dias do meu calendário, pois estes seriam passados com as mãos agarradas à minha cabeça, sem me conseguir mexer para onde quer que fosse.

Sofria por acção da malária, mas sofria ainda mais por acção dos medicamentos. Assim que os ingeria, sentia os ouvidos a tapar.

Pouco depois ligavam-se 2 turbinas dentro dos meus tímpanos que não me deixavam ouvir o cantar dos passarinhos, que alegremente voavam à volta das árvores que circundavam a minha tenda.

Depois das turbinas ligadas, vinham as dores de cabeça e de corpo.

Queria dizer “…aaaaaaiiiii…”, mas ou não tinha força, ou não conseguia ouvir a mim mesmo. Apenas quando sentia a vibração das minhas cordas vocais, é que sabia que tinha soltado algum grunhido.

Na cama, acordava frequentemente a transpirar de frio e tremer de calor. Tinha o metabolismo completamente desregulado. Queria beber água, mas só o facto de ter que esticar o braço até a uma das garrafas que espalhara por toda a tenda, fazia-me pensar duas vezes. Doíam-me articulações que nem eu sabia que as tinha, além que o meu braço parecia que pesava 1 tonelada.

Por vezes acordava com os arranques das turbinas que tinha dentro da minha cabeça, e numa das vezes consegui ver o Pai Natal montado no seu trenó movido a jacto, às voltas ao farol da Praia da Barra. Quando o barulho tornava-se quase ensurdecedor, eis que parava de repente… para voltar alguns minutos mais tarde.

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Deslocar-me até ao restaurante da Casa Luna paras as refeições, era quase uma aventura, mas fazia-me bem. Não só lavava as vistas, como também permitia que a minha cama secasse o meu suor e permitia que a tenda arejasse, pois com tanto remédio esta já cheirava a hospital…

Os dias foram passando e simultaneamente eu fui melhorando a minha condição.

Por fim, já conseguia olhar para o mapa e preparar novas etapas, sem que as letras desfocassem e sem sentir tonturas.

No balanço final acabei por retirar Vilanculos do meu itinerário, pois os dias passados em tratamento e os dias que eu ainda iria passar em recuperação, não me permitiriam grandes descuidos. Não podia dar-me ao luxo de deixar o meu Visto acabar sem chegar a Maputo.

Do alto da varanda da Casa Luna, conseguia ver uma grande extensão de praia.

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Nos dias de céu limpo, e mesmo em frente onde me encontrava, DSCF8239conseguia avistar com clareza a Ilha de Bazaruto. Um pouco mais para Sul e esforçando ligeiramente as vistas, era possível distinguir a Ilha de Santa Carolina, que se situava entre o Continente e Bazaruto.

Aos poucos fui conseguindo fazer aquilo que tentara na minha primeira manhã em Inhassoro.

 

Desfrutar calmamente da praia e molhar os pés no Índico.

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A praia permanecia quase sempre deserta. Apenas as gentes da pesca e alguns garotos partilhavam as areias comigo.

A maior parte deles teimava em cumprimentar-me com um “How are you?”, uma tendência que vinha a acontecer com cada vez com mais frequência, à medida que eu me dirigia para Sul.

 

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As manhãs passadas em curtas caminhadas matinais, permitiram-me estudar com mais detalhe as embarcações usadas na pesca costeira.

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Um punhado de tábuas a fazer a forma de um bote, sem qualquer tipo de calafetação e por onde conseguia entrar e sair um peixe.

Vários pedaços de esferovite amarrados uns aos outros e presos às tábuas, impediam que a embarcação fosse ao fundo.

As redes, os anzóis, as canas e os remos, seguiam algures em cima das esferovites juntamente com o pescador.

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Nos meus últimos dias de recuperação, recebia a visita do Filipe e do Pedro, dois colegas que estavam a trabalhar Moçambique e que resolveram aparecer em Inhassoro para passar um par de dias.

Eu já me encontrava praticamente curado, embora ainda não estivesse a 100%, sentia-me bastante melhor. Condição mais que necessária para embarcarmos num passeia de barco à Ilha de Santa Carolina.

À chegada à Ilha, deparámo-nos com um cenário paradisíaco ao melhor nível de qualquer capa de revista.

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Águas transparentes e areia limpa, circundavam toda a Ilha. Do barco podíamos ver vários cardumes de peixes de todos os tipos e de todas as cores, que se refugiavam junto aos corais assim que se sentiam ameaçados.

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Já na Ilha deparei-me com um cenário surpreendente e para o qual eu não estava à espera.

Por toda a Ilha havia ruínas de algo que deveria ter sido admirável, e que por todas as razões e mais algumas fora saqueado, vandalizado e encontrava-se neste momento, praticamente ao abandono.

À entrada podia-se ver uma placa onde lia-se “Ilha de Santa Carolina – 1952 – Obra Edificada por Ana e Joaquim Alves”.

Logo de seguida entrava-se numa avenida “pedonal” que levava os visitantes a vários cantos da Ilha. Seguindo para a esquerda, chegava-se ao aeródromo. Indo para a direita, chegava-se um conjunto de casas que eram de impossível identificação. E pelo caminho principal chegava àquilo que deveria ter sido o edifício principal o Hotel.

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A vista fantástica contracenava completamente com o ar de destruição do edifício. Deste podíamos ver apenas o esqueleto, pois todo o tipo de adornos havia sido arrancado ou destruído.

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Do 1º andar, onde suponha ter sido uma sala panorâmica, era claramente visível a Ilha de Bazaruto. À minha esquerda e à minha direita, conseguia ver vários blocos de edifícios ao longo da praia (desta vez mais pequenos) que deveriam ter sido os blocos com os quartos de “menor valor”.

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Poucos foram os que me conseguiram explicar como deixaram uma construção que deve ter sido tão bonita, chegar ao estado que chegou.

DSC01618Perguntei se foi durante a Guerra Colonial…

…Responderam-me que não.

Perguntei se foi durante a Guerra Civil…

…Responderam-me que não.

Então?

-...foi depois da Guerra… – respondeu alguém.

 

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De volta à Casa Luna, passei as últimas horas de repouso na companhia do Filipe e do Pedro (além de estar sempre acompanhado pela Aziza, pelo Carlos e por todo o pessoal da Casa Luna).

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Estava a saborear a “boa vida” e a começar a gostar dela. Comer, dormir, Sol, praia, piscina… No entanto as minhas pernas começavam (pouco a pouco) a pedir quilómetros, ao mesmo tempo que crescia em mim, um nervozinho miudinho para voltar à estrada.

Olhando para o mapa geral da minha viagem, recordava com saudade os momentos vividos em cada uma das etapas…

Mapa Geral

Estudando o mapa de Moçambique, era facilmente perceptível que Maputo era já ali.

Mapa Moz

Já não necessitava de abrir o meu mapa desdobrável em cima de uma mesa grande. Agora, bastava-me abrir 2 dobras… e Maputo estava logo ali.

De olhos postos no mapa, tentava adivinhar o que o país ainda teria para me oferecer. Tendo em conta que cada etapa percorrida, era menos um dia da minha curta viagem…. E cada dia passado, era menos um dia de permanência em Moçambique, pois já me encontrava de 2ª e última prorrogação do Visto.

No que respeitas às feridas que ainda trazia nos tornozelos e nos nós dos dedos, os dias passados em Inhassoro foram de alguma maneira uma bênção para a sua cicatrização.

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Já não havia carne à mostra. Agora eram só croscas amareladas e crateras na minha pele.

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A próxima etapa seria até Mapinhane, uma povoação a cerca de 95Kms de Inhassoro.

Uma etapa relativamente fácil, dependendo do que a bicicleta havia reservado para mim e dependendo também, da reacção do meu corpo à recuperação da malária.

No final, podia dizer que apesar do azar de ter apanhado malária, fui apanha-la no melhor sitio do mundo, onde contei sempre com o apoio da Aziza, do Carlos e de todo o pessoal da casa Luna.

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