Encontrava-me em Quelimane, Capital da Província da Zambézia, e cidade onde iria passar alguns dias.
Tinha um plano mais ou menos traçado para os dias que se seguiriam. Em primeiro lugar iria passar algum tempo com um grupo de amigos que também estava de passagem pela mesma cidade. Em segundo lugar, trataria de planear a minha rota pós Quelimane. Em terceiro e em último lugar, seria obrigado a empregar umas horas, naquilo que menos vontade tinha… a manutenção da bicicleta.
O objectivo de retirar a barriga de misérias, já estava intrínseco na paragem em Quelimane pelo qual não necessitava de estar mencionado nos pontos anteriores.
Logo no primeiro passeio diurno pelas ruas de Quelimane, pude observar com outros olhos o lamaçal que eu atravessara no dia anterior. Apesar de na altura ter perfeita noção que havia me sujado (de lama) mais em Quelimane do que em toda a viagem, somente agora conseguia ter uma percepção do real estado em que se encontravam algumas das ruas da cidade.
Muitas viaturas optavam por circular com 2 rodas sobre o passeio, evitando deste modo que “desaparecessem” no meio dos lagos de lama.
Quem visita Quelimane, não pode deixar de lado a famosa praia de Zalala, situada depois do vasto palmal, a 30Kms da cidade e onde (ainda) é possível desfrutar da beleza natural.
Apesar das recentes construções em cimento ao longo da zona costeira, o areal encontra-se intacto. A protecção da orla costeira é feita por imponentes pinheiros que dão abrigo a quem quer se proteger dos raios solares.
Do lado esquerdo de quem chega à praia, desenrola-se a grande parte dos negócios da pesca. É lá que chegam as pequenas embarcações com o resultado de horas no mar, para logo de seguida venderem ao cliente, o fruto da sua pescaria.
Um pouco por toda a parte, alguns miúdos tentam a sua sorte com os turistas, oferecendo todo o tipo de recordações, serviços, ou mesmo alguns exemplares da fauna local.
Alguns metros antes da praia, encontra-se o simpático restaurante do Sérgio. Na minha opinião, o melhor local de Zalala para deliciar os beiços com uns saborosos camarões grelhados e um espectacular peixe de dois palmos e meio de comprimento.
Ao longo da marginal de Quelimane, avistam-se os esqueletos encalhados de algumas embarcações que outrora deram vida ao porto da cidade. Junto ao pontão, várias pessoas entram e saiem de pequenos barcos, que fazem a ligação entre as duas margens separadas por um braço do mar.
Do outro lado da marginal, está a velha Catedral de Quelimane. Um edifício construído em 1776, deixado ao abandono e à mercê de quem não tem outro tecto para dormir.
No seu interior, o desleixo, o vandalismo e a incúria estão presentes por toda a parte.
Das paredes originais, já pouco ou nada resta. Do topo destas, várias raízes descem entre o reboco e as pedras da parede, arrancando tudo que impeça a sua livre circulação, na procura de “alimento”.
O cheiro a podridão e a fezes, inunda as narinas de qualquer pessoa que se aventure pelo interior da igreja. Num ou noutro canto, restos de caixas de cartão e alguns sacos de plástico com os pertences dos residentes clandestinos do edifício.
As campas ou os escritos em pedra que ainda se encontram cravados no solo ou nas paredes da igreja, carecem de protecção e restauro… Tal como todo o edifício (datado do século XVIII), que de uma forma geral pertence ao riquíssimo património histórico de Moçambique, mas que de certa forma também é parte da história de Portugal.
Os dias passados em Quelimane passavam mais depressa do que eu pretendia. Nas horas vagas, enquanto me deliciava com uns típicos sabores da terra, planeava a minha rota para Sul.
De uma certa forma, achava que já estava na recta final da minha viagem de bicicleta por África, apesar de faltarem cerca de 2000Kms para chegar a Maputo.
O meu próximo destino seria a cidade da Beira, mas pelo meio queria visitar outros lugares remotos de Moçambique. Um deles era a conhecida ponte D. Ana localizada na vila de Sena. Uma ponte construída em meados dos anos 30 e que outrora fora a maior ponte ferroviária de toda a África. Para visitar a ponte, teria que fazer um desvio de 135Kms (trajecto a vermelho) por estradas das quais não fazia a mínima ideia do seu estado.
Seria uma opção em aberto, para ser estudada ao longo das próximas etapas.
O Parque Nacional da Gorongosa era também um dos destinos a visitar antes de chegar à Capital da Província de Sofala. No entanto ainda teria muitos quilómetros para percorrer, antes me dedicar a estes calculismos.
Neste momento, o mais importante era planear cada etapa até chegar à vila de Caia e obter todas as informações úteis à minha viagem.
Além disso, o pouco tempo que me restava na cidade de Quelimane teria que ser aproveitado paras as vistorias e inspecções à bicicleta.
Numa primeira abordagem ao meu meio de transporte, identifiquei 4 raios partidos.
Os quais ocuparam bastante do meu tempo e que puseram-me a pensar se o flagelo da roda traseira havia desaparecido para sempre ou se voltava a atacar, agora por outros meios.
Para não bastar, detectei também sérios problemas com o desviador traseiro.
Um deles estava relacionado com o cabo das mudanças, que estava estripado impedindo que o seu movimento efectuasse o efeito devido. Algo que acabaria por ser solucionado com a aquisição de um cabo de travão de motorizada e a respectiva adaptação para a minha bicicleta.
O outro problema estava directamente no desviador traseiro, que se encontrava completamente solto. À primeira impressão, supus que a mola (no seu interior) estivesse partida. Mas após alguns minutos a tentar desmontar o desviador e investigar o seu interior, acabei por descobrir que a mola encontrava-se intacta. Havia apenas saltado da sua posição original, devido às folgas que o desviador manifestava.
Com tantos imprevistos para reparar na bicicleta, acabaria por atrasar a minha partida de Quelimane em 24 horas.
Assim que a bicicleta voltou ao seu estado de operacional, iniciei o processo de despedidas.
Para trás ficavam os momentos de vida social,…
… a vitrina da pastelaria e os deliciosos pequenos-almoços.
Pela frente teria os habituais dias com formato de imprevisível, que tanta ansiedade me causavam…
A próxima etapa seria (curta) de regresso a Nicoadala, onde preparar-me-ia para as longas etapas até Caia. Pelo caminho estudaria a hipótese de visitar a Vila de Sena, ou seguir direito para o Parque Nacional da Gorongosa.
hã, hã!!! :P
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