Eram 135kms que me separavam de Lucusse e o que eu tinha previsto fazer em dois dias, iria tentar fazer num dia só. As últimas informações que tinha obtido, confirmavam que a estrada até Lucusse era em asfalto bom durante cerca de 30 a 40kms, seguido de umas zonas de terra batida e depois passava para uma estrada antiga de alcatrão, mas que permitia um carro andar acima dos 80km/h.
O Max tinha viajado para o Brasil sem que pudessemos tirar umas fotografias juntos, no entanto deixou a casa à minha mercê (obrigado Max).
Parti para Lucusse às 7h45 por uns caminhos refundidos pelos arredores de Luena. Ao que parecia essa era a estrada principal para seguir em direcção ao Sul. Após penar uns 20 minutos para subir um morro em terra batida, eis que piso finalmente o asfalto. Era asfalto novo que quase me fazia esquecer o que passei para chegar a Luena.
Estava a andar bem, sentia que as pernas tinham repousado o suficiente e estavam a corresponder. O pequeno-almoço (esparguete) também parecia ajudar ao bom desempenho físico. Notava as pernas a rolar e rolar cada vez mais. Assim que atingiam determinada rotação pediam imediatamente um mudança mais pesada… e logo a seguir outra… e depois outra.
Com tanta energia disponível para aplicar nos pedais, fui alimentando a fome sôfrega das minhas pernas com sucessivas multiplicações das relações entre carretos. Circulava agora a velocidades médias de 30km/h e o mais impressionante era que estava a conseguir manter o ritmo, mesmo que a estrada tivesse uma ligeira inclinação. A deslocação de ar entre os auscultadores e os meus tímpanos era de tal maneira ruidosa, que eu não conseguia distinguir a música com que o meu iPod brindava o dia.
Ou o esparguete tinha dado muita energia, ou os dias de descanso tinham feito muito bem às minhas pernas…
Pouco depois descobri que não… não era nada disso… era apenas o vento que estava a favor…
O alcatrão acabou e deu lugar à terra batida. No entanto não era razão para abrandar o ritmo, a estrada era larga o suficiente para conseguir desviar-me dos buracos que iam surgindo.
Alguns quilómetros mais tarde, atingi a tal estrada “deixada pelos portugueses” ainda antes da guerra. Era uma estrada estreita com alguns buracos e algumas zonas onde o alcatrão tinha desaparecido por completo, mas de uma maneira geral permitia-me rolar sem grandes dificuldades.
Quanto mais afastado estava de Luena, mais raro era de avistar uma aldeia. Passava longos períodos sem me cruzar com ninguém, no entanto quando isso acontecia era sempre uma festa para ambas as partes. Da minha parte por ver alguém, afastando o sindroma “leão”. Da outra parte por ver um turista a andar de bicicleta, tal como eles.
A dada altura cruzei-me com um vulgar casal de aldeões. A princípio não me apercebi da situação, talvez por estar habituado, mas pouco depois analisei-a melhor e fiz o meu julgamento ao cenário com que me deparava.
A mulher trazia um pacote (ou cesto) na cabeça, uma criança pendurada nas costas e nas mãos segurava o guiador da bicicleta que por sua vez também trazia uma ligeira carga. O homem vinha dois metros à frente de mãos a abanar.
A zona entre Luena e Lumbala N’Guimbo era uma zona fortemente estigmatizada pela guerra. Principalmente a região entre Lucusse e Luvei.
Segundo diziam os locais, “a guerra começou e acabou aqui”!
Estava à vista de todos os que viajavam nesta estrada (que não eram muitos) as carcaças de tanques, camiões militares, helicópteros etc, abatidos durante os tempos de guerra. Era possível observar os chassis dos camiões curvados e contorcidos devido à energia explosiva de uma mina, observar os alvéolos das balas que trespassaram as portas dos veículos e tentar imaginar aqueles que padeceram ou mesmo tombaram juntamente com as viaturas em que se faziam transportar.
Continuava sem ver ninguém durante quilómetros e quilómetros seguidos. Mantinha o meu iPod a debitar musica para os meus ouvidos, mas com o volume baixo o suficiente para conseguir ouvir os sons circundantes. As paisagens tipo “National Geographic” constantemente faziam-me abstrair da música que passava pelos auscultadores e imaginava as narinas que poderiam estar a detectar o meu odor ou os pares de olhos que estariam a observar-me.
Mas, mais cedo ou mais tarde aparecia outro ciclista… fazendo com que a ideia “safari” se evadisse da minha mente.
A estrada apesar de muito antiga, continuava com alguns troços em bom estado, talvez por não ter muito trânsito, que permitam-me continuar com uma boa média horária.
Cheguei a Lucusse às 15h15 depois de 135kms a pedalar. Lucusse era uma pequena vila com casas vitimizadas pela guerra e também com alguns edifícios novos prova do empenho na reconstrução do país.
Encontrar água mineral ou bebidas frescas era agora missão impossível. A população abastecia-se a balde com a água do rio e depois de escurecer acendia-se a lamparina. Lucusse estava provido de um gerador potente o suficiente para alimentar toda a vila, mas estava com problemas na bomba manual de diesel e enquanto esta não fosse substituída, não haveria electricidade para ninguém… a não ser que tivesse o seu próprio gerador.
Dirigi-me ao edifício da Administração para saber onde poderia montar a minha tenda e falei com a Administradora Adjunta. Expliquei-lhe a razão por estar em Lucusse, qual era a minha intenção e o meu projecto. Em menos de 5 minutos estava instalado num quarto na Casa Protocolar da Administração e com direito a jantar em casa da Administradora Adjunta.
A etapa do dia seguinte seria até Luvei, cerca de 100kms para Sul.
oi
ResponderEliminaro Ricardo Rocha criou um grupo de apoio no Facebook ...
http://www.facebook.com/group.php?gid=117500874940238
Grande Fontes! Dá-lhe com isso! Quando chegares à Pátria, eu pago as Carlsberg no Toc'a!
ResponderEliminarGrande abraço
Quais leões qual carapuça! O Mestre chega para os leões todos! O Niger manda abraços!
ResponderEliminarContinua companheiro.
ResponderEliminaravança sem medo, que os leões não querem nada com algo tão diferente como um branco numa bicicleta...
abraço
Amigo Fontes,
ResponderEliminaré como diz o Francisco Ribeiro. OS leões ao verem-te de bicicleta nem te tocam...comentam uns cons os outros que vai ali um nativo bem doente e que deve cair mal...
Um abraço e força
O funge deu lugar ao esparguete mas o efeito é o mesmo ! Força nas pernas e ânimo redobrado .
ResponderEliminarAbraço
Ângelo
Eu cheguei ao Lucusse no dia 7 de Setembro de 1973. Apesar de tudo ainda tive direito a um duche de água fria.
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