A estadia em Chocas-Mar não havia sido programada, contudo a tranquilidade e a beleza natural impediam-me de deixar o lugar.
Estava alojado na casa do Jorge, uma pequena vivenda à entrada da vila e a uns escassos 20 metros do mar.
Todos os dias acordava com o Sol por detrás do Oceano, enchendo de luz todas a casinhas situadas na orla costeira.
Depois do banho matinal nas águas do Índico, tinha sempre o pequeno-almoço (preparado pelo António), na mesa da varanda.
Não me cansava de deliciar a boca, com fruta fresca, cereais e sumo.
Os almoços e jantares iam pelo mesmo caminho. Quase sempre preparados pelo António (cozinheiro) e em quantidade suficiente para alimentar o meu corpo.
Evidentemente, tivemos que tomar medidas extra no que respeita à gestão dos stocks de géneros alimentares. O facto de ser apenas mais um em casa, eu assimilava a mesma quantidade de comida que os outros todos juntos. Iam-me valendo as minhas papas Cerelac, que comia entre as refeições.
Os dias eram passados na praia ou não varanda da casa, sempre em constante confraternização com os meus anfitriões.
A vila de Chocas-Mar conseguia manter muitos dos traços originais, à excepção de uma ou outra casa, reabilitada com extravagantes designs e produtos de construção. Talvez por ser época baixa (Inverno) a povoação encontrava-se quase desértica, apenas com alguns locais que se dedicavam à pesca.
Muito possivelmente o resultado da pescaria destinava-se a alimentarem as necessidades das cidades ou outros centros populacionais, pois todos os dias saiam carradas de peixes que chegariam para alimentar a duas a três vezes a vila das Chocas.
As praias ao redor eram pavimentadas com uma fina areia branca, que não se cansava de reflectir a luz solar até que o Sol desaparecesse nas traseiras das casas.
O mar, praticamente transparente, permitia qualquer pessoa a aventurar-se nas suas águas, sem que perdesse “pé”.
Sentia que estes eram os primeiros dias de verdadeiro descanso, desde o início da viagem. Com tanta tranquilidade e mordomias, até me esquecia que tinha uma roda na bicicleta que poderia dar as últimas a qualquer momento, deixa-me encalhado.
De facto, os momentos dedicados à bicicleta foram mínimos. Esta apenas usufruiu de uma lavagem à pressa, mais uma reparação ao suporte da bolsa da bicicleta (que partira antes de chegar a Nacala) e uma afinação nos raios. O resto foi tudo muito superficial. Uma inspecção ao estado da pedaleira do meio (ainda tinha dentes) e à suspensão dianteira, que apresentava folga.
Pela primeira vez em toda a viagem, senti o doce sabor da “preguicite”.
Não tinha que me preocupar com a roupa, pois o Joaquim (guarda) tratava das lides todas, lavando impecavelmente à mão, a roupa dos 4 habitantes da casa.
Nem tinha que me preocupar com a comida, porque o António tratava-nos bem.
Os problemas vinham quando alguém pedia um pão ao António, e este respondia:
- Não tem… Patrão Pedro comeu o pão todo!
Ao longo do dia podia-se avistar vários tipos de actividades económicas da população local.
Todas elas voltadas para o mar, desde a mais simples até à mais elaborada.
Desde os pequenos miúdos que se dedicavam à pesca à linha, em cima dos recifes…
…ou dentro de água…
…passando por aqueles que se aventuravam no Oceano, nas suas pequenas canoas escavadas num só tronco de árvore…
Terminando nas refinadas embarcações à vela, que tanto se dedicavam à pesca, como ao transporte de passageiros entre as várias populações da zona.
Por duas vezes preparei-me para deixar este paradisíaco lugar e partir em direcção à Ilha de Moçambique, mas era constantemente persuadido a ficar mais um dia.
Não só pela beleza natural das Chocas, como também pela boa companhia.
Aliás, segundo várias opiniões eu já tinha atravessado África da costa à contra costa, como tal tinha todo o direito de ficar nas Chocas e seguir para Maputo de carro.
No entanto essa não era a minha intenção, pois queria levar o meu projecto até ao fim, por mais aliciante que fosse a proposta.
Além disso tinha o meu visto quase a caducar, o que não me permitiria grande desleixo com os dias restantes. Ainda queria dedicar uns 2 a 3 dias à Ilha de Moçambique e contava com outros tantos para chegar a Nampula. Local onde iria renovar o visto.
Apesar de estar a poucos quilómetros da Ilha de Moçambique e de poder optar por uma travessia marítima, escolhi voltar a sentar-me no selim da bicicleta e rumar por estrada até ao destino. Seria uma etapa relativamente curta (+/- 70Kms) que me permitiria visitar com mais calma alguns locais de interesse antes de chegar à Ilha, tais como o Palácio dos Governadores (perto de Mossuril) e o primeiro aeroporto de Moçambique (Lumbo).
Pedro
ResponderEliminarGde aventura! Conheço Angola e Moçambique (não tão bem quanto gostaria) e são sem dúvida dois países que guardo no coração (apesar da loucura de Luanda! lol)
Vivi dois anos em Luanda e não resisto a enviar-lhe o link do blog de um amigo que se encontra a fazer o trajecto luanda - Lisboa, com passagem pelo sul de africa (moçambique inclusive)de moto.
Porque sei que quem passa por África nunca esquece e porque imagino, tão bem, que quem, como o pedro e o gonçalo (meu amigo), embarca nestas aventuras, que todos os outros consideram loucas, nunca volta por completo e deixa sempre um pouco de si no que passou, ansiando pelo que virá, aqui lhe deixo o link do blog do Gonçalo Barros:
http://africadomeucoracao.blogspot.com/
felicidades
Raquel Fernandes
Pelo relato, torna-se quase irresistível o desejo de conhecer Chocas do Mar.Para não falar do que já ficou para trás... Parabéns pelas fotos, também. S.C.
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